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Uma crítica por Marta Gil: "The Creative Act: A Way of Being", de Rick Rubin (2023)

The object isn’t to make art, it’s to be in that wonderful state which makes art inevitable.

- Robert Henri



Conhecido como um dos maiores produtores musicais da atualidade, responsável por trazer ao mundo os primeiros discos de Hip Hop e alguns dos melhores álbuns da história da música, Rick Rubin pegou na sua experiência em estúdio com incontáveis artistas e publicou, em 2023, The Creative Act: A Way of Being. Nesta obra, Rubin apresenta, não como fazer arte, mas reflexões sobre como viver de uma forma em que a criação artística se torna inevitável.


A base da sua análise é: fazer arte é simplesmente criar algo que não existia antes e não é necessariamente algo que tenha de ser testemunhada por outros; e a criação artística é apenas uma reflexão da maneira como o artista olha para o mundo, não sendo uma representação fiel da realidade. A mera existência gera criação da forma mais profunda possível, uma vez que esta é a experiência da realidade, de reações elétricas e químicas que gera uma resposta.


Antes de apresentar as etapas para a criação, Rubin reflete sobre o papel da Arte, argumentando que esta não é um produto ou uma ferramenta, pois transcende a condição humana. O universo transmite sinais através da Fonte, e os artistas são meros tradutores desses sinais. Para receber esses sinais é necessário: 1) cultivar a consciência/sensibilização; e 2) olhar para o mundo de forma espontânea, apenas a experienciar os sinais, em vez de os analisar através dos valores sociais que estão interiorizados, particularmente a ideia de “utilidade” de algo. É necessário praticar a abertura para receber as pistas dadas pela Fonte e, consequentemente, esta sensibilização melhora a conexão e a participação no mundo. Assim sendo, a natureza e o subconsciente são fontes incontestáveis e ilimitadas da criação, e o ambiente onde a criação é feita depende da intenção.


The ability to look deeply

is the root of creativity.

To see past the ordinary and mundane

and get to what might otherwise be invisible.


Um dos argumentos mais interessantes de analisar prende-se com o facto de, apesar da autocrítica e auto-questionamento (self-doubt) serem associados à insegurança, à dor e ao medo que tanto se tentam esconder, não devem ser descartados enquanto instrumentos para o projeto, uma vez que a arte é a reflexão da verdade do artista. A sensibilidade e a vulnerabilidade podem enriquecer a arte e, muitas vezes, são os veículos para alguém se tornar artista. No entanto, quando em demasia, estes podem ser entraves para a criação artística. Se o desejo de fazer arte for maior que o sofrimento e o medo, então o artista deve olhar para a arte não como uma competição, mas como um processo de tentativa-erro que irá alimentar um próximo projeto ainda melhor; considerar que o projeto em mãos não o vai definir para a eternidade; concluir que a única missão é completar o trabalho para poder começar o próximo; e ver a arte como um mero exercício de experimentação cujo resultado é imprevisível. O objetivo da criação é despertar algo no artista e nos outros.


Art creates a profound connection

between the artist and the audience. 

Through that connection, 

both can heal.


Também as regras são vistas como limitações que têm de ser quebradas se não forem úteis à criação. Esta premissa é bastante disruptiva, especialmente tendo em conta que a educação artística está a ser cada vez mais difundida e aprofundada. Porém, basta observar a História para perceber que muitos dos maiores artistas foram fortemente marginalizados por irem contra a “onda” da época ou contra aquilo que era considerado a forma correta de fazer arte. Ainda, artistas bastante apreciados não têm qualquer formação teórica ou técnica, e é isso que lhes permite ir mais além – o facto de não conhecerem as regras faz com que a exploração seja mais orgânica e sem limites. É esta rutura com o tradicional que causa tanto fascínio, uma vez que o público passa a olhar para a realidade com uma lente diferente. 


Ao longo de toda a obra, Rubin sugere como abordar a criação artística, como sair de impasses e conciliar os desequilíbrios na inspiração, de forma a continuar a trabalhar num projeto. Todavia, estes conselhos e reflexões são dados de forma bastante dispersa, sem um encadeamento lógico. Tendo em conta que são expostas as diferentes fases de uma obra, faria sentido criar uma distinção clara entre estas e os pensamentos à parte e, a partir daí, contar a história da criação – começa-se com uma semente (ideia), cuida-se dela até estar pronta a ser desenvolvida, aperfeiçoada, apresentada ao público e parte-se para a semente seguinte – seguida de pensamentos soltos. Esta falta de segmentação torna a leitura um pouco confusa e deixa o leitor sem perceber onde o autor quer chegar. 


Ainda assim, é uma obra que deveria fazer parte da vida de qualquer pessoa. Tal como referido logo no início, uma vida artística não se dirige só a artistas, e os conselhos dados podem ser transpostos para qualquer situação: a criação de hábitos que alimentam o tipo de vida que o leitor pretende, com base na liberdade e na eliminação de entraves técnicos que, ao mesmo tempo, proporcionam mais oportunidades de criar; os passos a dar quando uma pessoa se vê num impasse, sem inspiração e sem conseguir resolver um problema; a importância da experimentação e da brincadeira numa vida feliz e saudável; a separação do trabalho da identidade, de forma a reduzir ansiedade performativa e acabar com a vontade de controlo de elementos incontroláveis; e a importância de apreciar o momento e praticar o mindfulness para uma melhor captação de sinais do universo e uma melhor vivência com o mundo e com a natureza.


Num livro repleto de sabedoria com base em exemplos e experiências concretas, Rubin partilha de uma forma bem eloquente como viver de forma artística, qual a importância e o papel da Arte na vida humana. O seu potencial de transferência para todas as áreas da vida é inestimável.




 

Sobre a autora:


Marta Gil


24 anos. Coimbra.

Licenciada em Relações Internacionais na Universidade de Coimbra.

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